por Amanda Jansson
Se
estivesse vivo, o bailarino e professor de dança João Luiz Rolla
completaria 100 anos neste 25 de junho. Para saudar o Mestre, um dos
grandes nomes da dança no Brasil, o blog da PORTO ALEGRE CIA DE
DANÇA conversou com a sobrinha de Rolla, Lucia Helena Rolla, que
relembrou a vida e a carreira do tio e, com belíssimas palavras, ajudou a
fazer a merecida homenagem a este grande nome da arte.
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João Luiz Rolla foi um dos primeiros homens a praticar a dança clássica
no Rio Grande do Sul e, posteriormente, a manter uma escola de dança.
Qual foi seu papel para a difusão da dança como arte no Estado? Como ele
via a dança?
Como
um dos precursores da Dança no RS e, sobretudo, por se tratar de uma
figura masculina ocupando um espaço eminentemente feminino, Rolla, como
bailarino, deixa um exemplo de coragem e determinação por romper com os
padrões da época. Como professor e coreógrafo, atingiu seu mais
importante papel para a difusão da Dança. Viveu o ballet como a razão de
ser da sua vida. A Dança foi sua arte maior. Formou e influenciou
gerações de bailarinos, professores e coreógrafos que seguem atuando no
cenário nacional e internacional. Todos com a marca e o "carimbo" dos
ensinamentos de seu mestre.
- Quanto tempo a Escola de Dança João Luiz Rolla atuou e onde era sediada?
A
Escola de Dança João Luiz Rolla foi fundada em 1951 e atuou por 35 anos
na cidade de Porto Alegre. Teve várias sedes, dentre as quais a Rua dos
Andradas, no prédio do outrora existente cinema Cacique, a Rua General
Câmara, Rua Senhor dos Passos, Rua Alberto Bins, Rua Marechal Floriano,
sendo que, desde 1966, passou a funcionar nas dependências do Auditório
Araújo Vianna no bairro Bom Fim.
- Como o nome do bailarino se perpetua hoje na sociedade? Ele ainda influencia alunos e amantes da dança?
O
nome do Mestre Rolla constitui-se num marco da Dança do Sul do Brasil e
deve ser reconhecido como um dos mais completos coreógrafos
brasileiros. Gênio e talento à frente de seu tempo, não conhecia
obstáculos, apenas desafios que superava com muito trabalho, exigência
de si próprio, de seus alunos e de todos os que se envolviam com as
apresentações de sua escola. Basta lembrar a ousadia, técnica e
plasticidade de suas mais conhecidas criações, o ballet GRAND CANYON com
música de Ferde Grofé e 2001 UMA EXPERIÊNCIA PELAS FRONTEIRAS SEM FIM
DA DANÇA, com músicas da trilha sonora do filme 2001 Uma Odisséia no
Espaço.
Sua
obra continua sensibilizando os amantes da Dança e será sempre um
referencial para aqueles que desejam se aventurar pelos mesmos
caminhos.
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O que fez Rolla deixar o atletismo e entrar de vez na dança? Como a
professora Tony Seitz Petzhold atuou nessa época de sua vida? Quais eram
os nomes dessa área que o influenciavam?
Rolla
nasceu e cresceu em uma família apreciadora de música, teatro e
manifestações artísticas em geral. Desde menino teve a oportunidade de
participar de apresentações escolares exercendo já seu talento. Na
juventude, interessou-se por esportes e, na década de 30, tornou-se
atleta pelo Sport Club Internacional, onde praticava corrida na
modalidade 110 metros com barreira. Nessa época, conheceu a professora e
bailarina Tony Seitz Petzhold que o convidou para fazer uma experiência
com aulas de ballet em sua escola. Foi o divisor de águas em sua vida.
Apaixonou-se pela Dança e, desde então passou a se dedicar com total
empenho à nova vocação. Sua primeira apresentação ocorreu no ano de 1939
com o ballet A Bela Adormecida, criação musical de Walter Schultz
Portoalegre. Sua escolha estava feita. Sua paixão definida. Para sempre a
Dança.
Certamente,
nomes emblemáticos dessa área contribuíram para sua formação: Isadora
Duncan, Anna Pavlova, Nijinsky, Marius Petipa, George Balanchine, Martha
Graham, Vaslav Veltchek, Otto Werberge, Pina Baush e muitos outros,
foram objeto de seu interesse. Rolla foi um autodidata. Buscou
conhecimento em livros e viagens, aprimorando cada vez mais sua arte.
Indo mais além, se interessou em aprender sobre técnicas de palco,
iluminação, cenários. Nada lhe escapava na montagem de seus espetáculos.
Desde o figurino dos alunos, maquiagem, som, jogo de luzes, em tudo ele
estava presente, opinando, sugerindo, discutindo... De modo que muitos
nomes, muitos livros, obras, músicas e ritmos o influenciaram. Sem
esquecer sua professora, Tony Seitz Petzhold, como influência primeira
em sua arte e sua escolha.
-
Para ser bailarino, Rolla precisou contrariar um certo "machismo" que
havia em sua época. Como foi para ele conseguir destaque numa área que
era majoritariamente feminina?
Para compreendermos o gigantesco salto efetuado por Rolla, seu imenso grand jeté,
precisamos nos reportar ao que era a sociedade dos anos 30 numa cidade
como Porto Alegre. Estado orgulhoso de suas tradições gauchescas, em que
a dança folclórica praticada pelos homens materializava-se na figura
viril, calçando botas e vestindo bombachas, a cidade via surgir, não no
CTG, mas no palco, um homem que ousara trocar as bombachas pelo collant e
as botas pelas sapatilhas. Contava ele então com 27 anos. Corpo
perfeito, belo rosto, olhar instigante, o jovem Rolla lançava-se à dança
tal qual se lança uma flecha ao ar. Contando com o apoio de sua
família, dedicou-se de corpo e alma àquilo que já existia dentro de si e
que só então descobrira: a paixão por dançar. Sentia-se forte, o
suficiente, para enfrentar preconceitos. Não foi preciso. Seu trabalho e
sua excelência receberam reconhecimento imediato. Rolla rompeu
paradigmas, soprou novos ares, revolucionou idéias. A Dança fôra mais
forte, saíra-se vitoriosa. O salto estava dado.
-
Como se explica, na ocasião da abertura da Escola de Ballet João Luiz
Rolla, a grande procura, em uma época em que a dança não parecia ser tão
difundida?
Pela
sua competência, talento e gênio criador. Além disso, ele representava o
novo, o inusitado, a figura masculina atuando com firmeza e exigência
num reduto de domínio do feminino. A sociedade dos anos 50 também estava
mudando e o ballet era procurado por famílias que desejavam aprimorar a
educação de suas filhas. Não se pode esquecer que o ballet possui um
cunho formador, requer disciplina, tenacidade, exercícios repetidos à
exaustão. Por outro lado, é um convite à emoção, ao ritmo, à música... E
é justamente essa mistura de sensações que o torna uma arte tão
completa e apreciada em todas as épocas. Os ingredientes, ele os tinha
todos. A magia estava em dançar. E, de repente, a Escola de Dança João
Luiz Rolla transformou-se num pólo difusor desta arte e, em seguida,
celeiro de grandes bailarinos e profissionais da Dança.
- Rolla coreografava espetáculos de dança todos os anos para a Escola. Quais obras você destacaria nesta trajetória?
Primeiramente,
há que se dizer que tudo aquilo que o Mestre Rolla coreografou, fosse
no ballet clássico da mais pura tradição romântica, fossem ballets
contemporâneos, pantomima-ballet, coreografias que contemplaram a música
popular brasileira, ou o Jazz, absolutamente tudo, se transformava em
espetáculo de extrema qualidade. Sua obra, por inteiro, é perpassada
pelo toque de seu gênio criador, visionário, instigante. Já fizemos
menção aos dois marcos de sua criação: O ballet GRAND CANYON (1958) e
2001, UMA EXPERIÊNCIA PELAS FRONTEIRAS SEM FIM DA DANÇA (1969).
Considerados suas mais importantes criações, aclamados pelo público e
pela crítica, ambos foram apresentados no Theatro São Pedro, enquanto o
segundo, foi remontado com reapresentação em 1979 no Auditório Araujo
Viana. Na ocasião, o espetáculo foi assistido por milhares de pessoas,
povo e elite se misturando. Como Rolla queria. Arte para todos.
Além
destes Ballets, destacamos FINLÂNDIA e O CISNE DE TUONELLA com música
de Sibelius, BURLESCO de Bela Bartók, ASSASSINATO NA DÉCIMA AVENIDA e,
ainda, CATEDRAL SUBMERSA ao som da música de Debussy. Sem esquecer das
participações do seu corpo de Ballet em Óperas, como foi o caso de AÍDA
de Verdi. Todos memoráveis, que desejaríamos assistir mais uma vez e
outras mais.
-
Com sua história, o professor Rolla mostrou que é possível superar
obstáculos e alcançar o que se sonha. Qual a importância de relembrar o
mestre neste centenário de seu nascimento?
No
ano em que se comemora o centenário de seu nascimento, queremos
relembrar o Mestre Rolla de todas as formas. Mistura ousada de razão,
paixão e sensibilidade, movido por um gênio criativo e intenso, cumpriu
sua vocação existencial com a maestria dos virtuoses. Certamente estará
dançando em outras dimensões, buscando - coração inquieto - novos
ângulos, nova luz, novas coreografias... Como numa transcendente e
imortal EXPERIÊNCIA PELAS FRONTEIRAS SEM FIM DA DANÇA.
* fotos do arquivo do CEME - ESEF, UFRGS.
* fotos do arquivo do CEME - ESEF, UFRGS.
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